terça-feira, 12 de maio de 2015

TODOS OS TONS DE NEGRO


E havia negros minas e jejes
havia negros cambindas e malês
vieram nagos, mandingas e ketus,
Vieram milhares de homens pretos
fétidos e escuros como piche
negros homens e mulheres nús
cansados adentravam o trapiche
bem recebidos pelos urubus
tanto de ódio e picumãs
infectos de sarna e piolhos
escravos sem mais amanhãs
do porão, sob ferrolhos
cheios de angustias e medo
rumo a sorte ou a morte
presas do injusto degredo
de escuro e imundo tumbeiro
da infâmia do cativeiro
Negros cá morriam de banzo
outros matava o cansaço
a tristeza se perdia no semba
quando não lhe metiam no laço
no batuque,no jongo ou lundu
enchiam a pança agua
comiam de um parco angú
fartavam-se d´angustia e mágoa
dos ritos e rezas no calundu
cantar talvez lhes conforte
liberdade que se exalta e se cala
o castigo, um vazio de sorte
Talvez pra um fundo de vala
o sofrimento é um pouco da morte
Havia negros de ganho
com cestos, raízes, balaio
com ervas e frutas de apanho
nhonhô a olhar de soslaio
bugigangas,comidas,quitutes
mulheres vendendo desfrutes
a brancos buscando deleite
negrinhas co´a suas iaiás
miúdos e amas de leite
mucamas ajeitavam sinhás
flores nas vis carapinhas
negros buliçosos e irrequietos
negros com barris de dejetos
negras em trajes senhorinhas
Talvez vencendo os desdenhos
talvez um sorriso no cenho
Talvez o dia seguinte
Talvez mais nada
e não há!
Negro reverenciava o ar
as motanhas,as matas e o mar
sob a terra seu sagrado oculto
negro então cantava e se ria
resistia bravamente ao insulto
tristezas,humilhações e o medo
quem sabe um dia, a alforria
fugir, fugir, fugir do degredo
juntar-se a outros no quilombo
livrar-se do chicote no lombo
fugir feito um gato
correr o mundo sem destino
fugir de um capitão do mato
ou contorcer-se num vira-mundo
ou o tronco sob o sol a pino
Talvez um sonho de liberdade
e liberdade tardia houve
e o negro nunca soube
ganhou livre as ruas
como bem lhe aprove
sem eira,nem beira
ou tribeira