domingo, 25 de dezembro de 2011

ANNUS MIRABILIS




Annus Mirabilis

Jamais haverá ano novo, se continuar a copiar os erros dos anos velhos.

Luís de Camões

“Israciveis,  insensíveis, desumanos, preconceituosos....” 

Se fossemos elencar  todas as nossas falhas com certeza não pararíamos de escrever e teríamos realmente nada há o que brindar e encerraríamos o ano com vários “mea culpa” a cada ato falho , a cada tropeço, a cada erro dissimuladamente cometido nesses nossos 365 dias.

O período de festas magicamente se enche de algo novo e estranhamente transbordam em nossos  espíritos o contentamento, tornamo-nos   incrivelmente ébrios e fartos de esquecimento e extinguem de vez dos cérebros e nossos corações  os fatos que poderiam marcar mais este como um  “annus horribilis

Tecnologicamente tornamo-nos mais preparados, mais integrados com os fatos do nosso mundo, mais conectados, cosmeticamente cada vez mais perfeitos . Em contrapartida, no retrospecto dos nossos dias, presenciamos a violência, calamos aos preconceitos, ignoramos a fome, de alimento ou cultura, do próximo, perdemos contato com a solidariedade, nem desconfiamos do sentido da compaixão e viramos as costas a caridade e vimos a esperança  morrer nos corações das pessoas .

Credos e crenças ainda disputam um pedaço do céu às custas da ignorância de quem perdeu a confiança no estado, políticos fartam-se com os lucros da coisa que não é sua.
Alheio a tudo e cada fato, entregamo-nos com  a fúria de um guerreiro na busca de posições de destaque, rotulamo-nos doutos disso ou daquilo, assestamos todo o nosso poder mirando apenas o nosso bem-estar e viramos definitivamente nossas costas ao outro.

Acaba mais um ano e a maioria de nós busca crescer, alcançar o topo de alguma coisa e meu desejo é que , pelo menos, uma porção nós queira melhorar a si mesmo e então fazer refletir essa pequena melhora ao nosso próximo e ao mundo e possamos  abrir nossos olhos para a nossa cota de responsabilidade quanto aos males que afligem a humanidade.
Que esse seja um “Annus Mirabilis” a todos os homens de boa vontade.

Por Edson Ovidio

sábado, 17 de dezembro de 2011

OS INTOCÁVEIS


Intocaveis

            

“A violência faz-se passar sempre por uma contra violência, quer dizer, por uma resposta à violência alheia”.Jean-Paul Sartre
“Eu sou contra a violência porque parece fazer bem, mas o bem só é temporário; o mal que faz é que é permanente”.Mohandas Gandhi

Nesta semana minha amiga enviou-me um link para um vídeo no qual uma cidadã londrina ferinamente agredia  outros de  etnias diferentes que estavam no mesmo vagão onde ela se  encontrava. Desferia impropérios como se ela fosse a rainha de alguma coisa.
Esse fato chamou-me a atenção  para a forma como as ideias e filosofias podem de forma tão inusitadas passarem de nossa mente  para palavras e ações , assumindo a forma virulenta do monstro da violência.

Qual o nosso ideário?

Quão mal e cego pode ser o bem que hoje queremos?

Erguemos muros ou buscamos a igualdade entre os seres?

A fonte de toda a violência nasce de todos os  desvarios, quer  sejam eles  voltados pra  para ideias hegemônicas de um separatismo doentio ou do firme  propósito de nos rotularmos como uma casta excludente,  para a qual  as  aves de outras plumagem sejam definitivamente mantidas ao largo e  proscritas por nossa  ignorância emblemática contra  outras etnias, credos, padrões cultural estranhos a nós ou por qualquer outra cisma histórica.

Talvez a violência nasça de nossa boa fé, quando nos predispomos a criar grupos polarizados para direções que outros não compreendam, sentimentos que atendam a um determinado nicho, filosofias voltadas para um seleto grupo de idealistas utópicos ou qualquer outro padrão de pensamento semeado ao vento na busca de um pretenso mundo melhor.

Um mundo mais a nossa própria imagem e semelhança e que primeiramente favoreça a nós, nossa subsistência, a manutenção de nossos iguais e que outros espelhem os nossos sonhos e os espalhem entre as pessoas de boa vontade, porque nossa é a melhor filosofia, somos a casta superior, destinados a uma posição de destaque em qualquer lugar mais além, sob os auspícios de um cuidador!

Será que muitas vezes a nossa certeza de querermos apenas o bem universal, ao longo do tempo não seja o veneno nas mentes de pessoas de tempos à frente?

 Se pensarmos em algo melhor, queremos que as pessoas participem do nosso ideal emancipador, brandimos nossas armas de conquista, mas, de súbito compreendemos que o outro não preenche todos os requisitos do mundo ideal, voltamo-nos então as nossas armas cheias de boa intenção contra ele e gentilmente lhe viramos as costas, espalhando intransigência, porque o outro é diferente, não tem o nosso padrão de ideias. O que se estendia de dentro pra fora, sem barreiras, passa então a ocupar-se com os assuntos da nossa autodefesa egoísta e de princípios voláteis e efêmeros, porque agora passamos a erguer muros altos demais em nosso entorno. Intramuros precisamos proteger-nos, atrair os iguais, repelir e atacar os contrários.

Não será a violência a resultante das boas intenções do passado? Do ranço secular levado a frente pelas nossas crenças, idealismos e mentes que se perderam em algum lugar do passado?


sábado, 10 de dezembro de 2011

PRIMEIRA VISTA E OLHARES POSTERIORES



Olhares posteriores

"O mundo recompensa com mais frequência as aparências do mérito do que o próprio mérito."
François La Rochefoucauld  
 "Todos julgam segundo a aparência, ninguém segundo a essência."
 Friedrich Schiller ,
 "Pelas roupas rasgadas mostram-se os vícios menores: / as vestes de cerimónia e as peles escondem todos eles."
William Shakespeare  
 "Quando vemos um gigante, temos primeiro de examinar a posição do sol e observar para termos certeza de que não é a sombra de um pigmeu."
Friedrich Novalis 

Um amigo sugeriu-me como tema “um olhar por tras de outro olhar” e então lembrei instantaneamente de uma viagem que fizera, onde durante um jantar uma  senhora contadora de historias foi ate a  nossa mesa para contar um conto. Tão saborosa foi sua narrativa que tive a impressão que ela  derramou de si em nossas almas. O amigo ao meu lado colheu em si nada da nobre presença, porém a mim ela  desenhara em minha mente aquelas cenas de forma magistral . Dias após eu compartilhei com amigos, o fato insólito e então um deles comentou :

_ “ Eu adoro olhar  as coisas com segundos olhos”

Eu  sempre pensei minha caminhada assim e me alegrei por ver que outras pessoas também olham a vida com um foco mais aberto e com um olhar mais além e atento.

Quando percebemos as muitas vidas que cruzam pelas nossas próprias vidas diariamente,  costumeiramente  nos atemos a seus  padrões cosméticos, a graça, sinuosidade, elegância , títulos e fama  e  somos demasiadamente presos às tintas vivas e aos aspectos externos do outro, excessivamente arraigados aos padrões da forma. A repugna ,o desdém, o preconceito  são a envoltória de nossa ignorância  e nos impedem de transgredir,  ir além de nossos preconceitos e efetivamente enxergar o outro em toda a sua essência.

 A sabedoria, a dignidade e nobreza de sentimentos não escolhem potes e nossos anteparos quase sempre nos impedem que ousemos  surpreendemo-nos e  ir além  do involucro que envolve o outro e descobrir o ouro além do tecido de pobre urdidura. Porém , de  muitos ouvimos e sentimos em nós que  tardiamente  depararamos com a sutilidade da peçonha, a cupidez, o animal  escondidos  pelo exacerbo da beleza em pessoas que em dado momento impressionaram nossa retina, nossa cobiça e então entraram em nossas vidas via a inconsistência de nossas primeiras impressões.

Pele adentro transita nossa personalidade  com  qualidades, defeitos e falhas, também o outro se defronta com monstros que se ocultam sob o fino trato.Eternos insatisfeitos, fugimos de nossos corações e então tornamo-nos míopes ou cegos á  sutilidade  e a nossa própria essência , porque a medida que saímos de nos mesmos só enxergamos no outro aquilo que melhor se enquadra ao nosso universo de perfeição.

Vivemos num mundo de aparências onde a grife conta muito mais que a qualidade do produto acabado, onde a força do que não somos, a textura da nossa estampa, conta muito mais do que aquilo que efetivamente somos e podemos,  onde a perfeição da capa fala  muito mais do livro do que seu conteúdo.

Um dos segredos da vida está em olhar  as pessoas com o crivo da nossa percepção mais interna , com os olhos  da nossa essência, porque é necessário  estar atentos a fatos e pessoas que  se postam a nossa frente e em  nossas vidas  pelo capricho da precisão da sincronicidade  pois eles podem abrir portais , podem ser doadores de sabedoria, doçura e suavidade .

Seja atento!


Por Edson Ovidio




sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

AQUI & AGORA


Aqui & Agora

"Conhecerás o futuro quando ele chegar; antes disso, esquece-o." Ésquilo
“A verdadeira generosidade para com o futuro consiste em dar tudo ao presente”. Albert Camus
"A distinção entre passado, presente e futuro é apenas uma ilusão teimosamente persistente.  Albert Einstein


A proposta deste ensaio é refletir um pouco sobre o foco no agora. Sobre o quão lúcidos estamos neste presente momento e com que nitidez o aqui e o agora se nos apresentam aos olhos e percepções.

Imagine-se num dia em que você esteja das suas muitas preocupações, todas as amarguras, cobiças e vãs perguntas sobre o amanhã e isento de auto cobranças em relação a fatos e coisas que aconteceram num instante que se perdeu nas noites dos tempos, num dia em que seus títulos e peso pessoal lhes signifiquem absolutamente nada.

Imagine-se admirando cada detalhe de um glorioso dia, cem por cento presentes no aqui e agora, sentindo o tato do tempo contra sua pele, o perfume das flores e folhas presentes no seu caminho e ouvindo os pássaros que voam próximo de você.

Será que podemos trazer os nossos dias para essa realidade?

Todos temos a mesma percepção ou cada um apresenta uma diferente singularidade e realidade?

No universo de pessoas que privam a nossa convivência deparamo-nos com pessoas presas no passado, outras só tem olhos para o futuro, outros tantos se entregam a licenciosidade dos desregramentos dos nossos dias sem vínculos com o ontem, com o amanhã ou com o agora.

Conheço pessoas que mantém os pés no agora e a mente presa dias distantes de si, descrevendo a vida maravilhosa de glorias, conquistas, pompas, circunstâncias, títulos, rótulos e tintas de um passado cujo valor fugaz ainda lhes fascina e bem ou mal- assombra os dias presentes. Sei de pessoas que se perderam em labirintos de crises e desgostosos do pretérito e recusam-se a seguir um passo além, pois perderam forças para divisar esse instante de sua existência. Algumas que se entregam vorazmente a cata de lucros e abundancia para prover o futuro.

 Em nossa curta trajetória atravessamos os dias enchendo nossa bagagem com toda sorte de fatores e aspectos externos ao que somos e então digladiamo-nos em lutas infindáveis com vistas a um futuro recheado de conquista e bem-aventuranças palpáveis.

Nossa bagagem se preenche com o que podemos ter e ser ao longo de nossa caminhada e então brigamos por cada vez mais.

A voracidade do futuro  e  as angustias do ontem tomam todo o nosso foco de atenção enquanto o hoje, com todo o seu encanto nos oferece  a grandiosidade das sutilezas  e os fabulosos “insights” que nos tornam melhores seres humanos basta que vivenciemos  o  Aqui e agora.


Por edson ovidio

sábado, 26 de novembro de 2011

A CHAVE DO PROBLEMA


A Chave do Problema


"Todos os problemas são insolúveis. A essência de haver um problema é não haver solução. Procurar um facto significa não haver um facto. Pensar é não saber existir."Fernando Pessoa 

"A força de um problema tem que ver com a força de que dispomos."Vergílio Ferreira

A ideia desse texto é entender um pouco sobre   problema e divagar um pouco sobre o seu enfrentamento.

Creio que posso defini-lo como todo e qualquer obstáculo que sob nossa óptica pontual pareça ser intransponível e não lidável de maneira simples e objetiva

Talvez esteja ligado ao nosso medo do desconhecido, segundo o que imaginamos.
Será que sobreviveremos ou fraquejaremos ante a um embate iminente?

Quem de nós nunca perdeu noites de sono sem saber a saída de um problema?

A óptica do medo por vezes transforma pequenos pedriscos em montanhas intransponíveis e que então lançam suas sombras sobre nós e de súbito passamos nós mesmos a sermos parte do problema, como se a coisa a qual tememos, de repente passasse a ser nós próprios.

Quem teme o enfrentamento se escuda das soluções possíveis, porque na verdade os problemas são apenas uma questão de óptica mental; a mente amedrontada acomoda-se e percebe só a si mesma em turbulência e então se fecha numa concha e fundindo-se a seus monstros imaginários e refletindo a frente apenas os seus próprios temores.

À medida que caminhamos entre nossas conquistas e fracassos desenvolvemos mecanismos de ataque e defesa, criamos o ódio, a cobiça e o subproduto do nossa geniosa maquinaria mental são os múltiplos problemas que urdimos diariamente.

Fernando Pessoa sugere-nos a ideia do não pensar ou ouvir a nossa essência. Parece complexo e sem nexo, os sábios dizem que a existência deva ser bem dessa forma e eu creio na vida assim.

A ideia é que na vida sejamos meros viajantes de passagem concebidos para adquirir saberes e sabedoria, embora o preço do nosso progresso individual faça com que saiamos a recolher todas as pedras de maior brilho ao longo do caminho em nossas frenéticas buscas do ter e do ser, de títulos, rótulos e cargos.

A cada passo encontraremos pedras, pedregulhos, montanhas, penhascos e dificuldades a vencer. Haverá problemas ou desafios a frente, a forma como nós os encararemos dependerá apenas de nós mesmos.


 Por Edson Ovidio

sábado, 19 de novembro de 2011

OS ANJOS FAZEM XIXI


anjos fazem xixi


"A fama é a mãe de todas as virtudes. “Fonte - citado em Diógenes Laércio, Vidas dos Filósofos, BionAutor -.
A maioria das pessoas preferiria morrer a pensar. De fato, muitas o fazem. — Bertrand Russell
 
Faz pouco tempo morreu uma das divas da música, vitimada por si mesma, devido ao abuso de drogas e álcool. No dia de sua morte eu fiz um gracejo sobre ela e uma amiga retrucou:

__ Nossa! . coitada!.. Não se brinca com isso!

Achei interessante seu comentário; soou-me como se ela não merecesse um final inglório e agora passara a categoria de Anjo ou algo sagrado. 

Ouvi, dia desses um fã, de uma megaestrela americana, descrevendo essa como se exemplo de mãe abnegada, como se não tivesse, a olhos vistos,  apresentado traços de desiquilíbrio e outros abusos que a levaram a perder a guarda do filho. 

Voltando um pouco mais no tempo, certa feita, teci alguns comentários sobre um personagem bíblico e como resultado quase sofri uma agressão. Jovem senhora a minha frente ficou histérica, chamou-me de sacrílego e  instantes depois, sozinho, eu me fartei de rir.

Relembrando todos esses casos, eu fico a pensar sobre essa fronteira fácil entre o mito e a história; sobre o quão fácil nos é converter o malfeitor em anjo após sua morte, o bárbaro em santo, o vil matador em arcanjo, homem comum e um nobre donatário de fatia do céu e o astro um dos avatares de Deus.

Será que a fama e a morte têm fatos em comum?

Tenho cá com os meus botões que sim!

Os famosos são apontados como predestinados e benfeitores do momento cultural, como marcos referenciais a serem seguidos, apreciados e respeitados.

O beneficio do tempo exponencialmente açucara e enternece as historias de nossos antepassados, eleva o valor de seus feitos, mitiga lhes as falhas. Aos famosos, o agora glorioso espalha-se ao sabor do ventilador das mídias, agregando valores diferenciais às vozes e espalhando a  vacuidade do que pensam aos quatro cantos do mundo.

Quando nos formos desta para a melhor, passaremos do comum ao mito, outros falarão sobre nos com branduras, muitos serão heróis, outros tantos santos seremos então sagrados, iluminados, lendas.

Por Edson Ovidio

sábado, 12 de novembro de 2011

SAUDADES


saudades


Brusca manhã bate à porta
Prantos de saudades
Prenhados de dores
Lágrimas paridas de ais
 Em todos os cantos
Onde esses rios choram
D’alma derrubam a comporta
Afogo-me na ausência de ti
Sede mal matada de te ver
 Fria tarde
Na sala de estar
O vento sibila teu nome
Bate portas e janelas
Com vontade de te ver
 Edson ovídio (Vontade de te ver)

O que seria a Saudade?

Uma forma de carência expressa por amarguras e magoas dispares pela falta de alguém? Ou será uma sintonia precisa entre seres que, de repente, descobrem mais um coração pulsando dentro de si?
Dia desses ouvi de um grupo de linguistas ingleses uma análise sobre o sentido semântico de várias palavras em diversas línguas, nessa conversa houve um esclarecimento sobre a forma do uso e os sentimentos evocados com a palavra “Saudades” no português, sobre a diferença entre o que chamamos saudade e o seu equivalente em Inglês. Há um sentido diferenciado, uma nuance diferente do que se usa nessa língua. Apesar de todos os povos serem capazes de sentir as mesmas emoções, porque todos os humanos tem um mesmo modelo psicológico, nossa língua deu a esses sabores semânticos de nossa língua deram a esse feixe de sentimentos e emoções o nome de saudade.
Durante a vida estabelecemos elos com uma miríade de pessoas e a medida que mais intensamente as queremos tão mais fortes e profundos tornam-se os laços. Somos tão parte das pessoas as quais amamos que a todo o momento sentimo-nos como se fossemos sois orbitando em torno de outros tantos ou como se de nós partissem diminutos fios que nos unem a outros e formando uma gigante teia de seres que o quanto mais distante o outro de nós se encontre, mais fortemente sentimos a força de atração que nos une a ele.
As vezes passamos a vida toda sem sentir o quão intensamente queremos aquele que está tão próximo até que o imperativo da distância afasta-nos desse alguém, então acordamos para a singularidade do querer bem, pois sopra a alma um vento intenso chamado saudade.
Nascemos para ser parte de um todo, numa constante e gostosa atração, vencendo tabus, preconceitos, infiltrando-nos pelas frestas das diferenças e indiferenças e, de súbito, descobrimos nossas almas em sintonia com várias outras e nossos corações batendo saudades.
 
Por Edson Ovidio





domingo, 6 de novembro de 2011

OS EXCLUÍDOS


Os Excluídos


"A pior coisa que a miséria te oferece / é a de tornar-te ridículo diante de todos."Fonte - SátirasAutor - Juvenal

"A pobreza é indispensável à riqueza, a riqueza é necessária à pobreza. Esses dois males engendram-se um ao outro e sustentam-se um ao outro. O que é preciso não é melhorar a condição dos pobres, mas acabar com ela."Autor - France , Anatole 
 "Um homem separado de um só homem é excluído de toda a comunidade” Aurélio , Marco


Diariamente passo por um ponto da cidade e diviso homens e mulheres amarfanhados ao relento e esquecidos de todos e talvez de si mesmos. Percebo suas faces disformes sob cabelos sujos e desgrenhados, trajes rotos, inchados pelo álcool, talvez, sob trapos como cobertores, grossas e encardidas peles dormindo ao abrigo da luz do dia. Sob a inconsciência dos dias que não sabem deles, a cegueira das drogas ou a carência de recursos para sobreviver.

Eu me pergunto: _ Em que fase de suas vidas foram parar ali? Será que a vida sempre lhes fora assim?

Há muitas historias, tenho certeza. Devem haver gênios perdidos , loucos e insanos, assim como os há entre os incluídos.

Há algum tempo atrás, eu e um amigo estávamos em Salvador e então resolvemos jantar no Pelourinho , subitamente abeirou-se de nossa mesa uma ilustre moradora de rua, de repente envolveu-nos com sua conversa inteligente e passamos algumas poucas horas ouvindo sobre ela e ao final fomos gentilmente escoltados até o taxi, como uma fera ela nos defendeu da abordagem de alguns desocupados .

Após alguns anos essa vivência ainda me deixa inquieto e estou sempre a meditar com os meus botões sobre a fragilidade das vidas. Apesar da segurança de nossos empregos, do calor de nossas famílias, nossa altivez e certezas e ao abrigo do teto que protege os nossos dias das inclemências do tempo.

A que castas pertencem os miseráveis?

São os degredados da vida, os excluídos da sociedade ou será que a carência de posses e recursos acorda algo na mente de alguém ou os faz perder definitivamente a identidade com a comunidade que passa e não os observa?

Cada ser em si, tem seus objetivos, sonhos, todos lidamos com amarguras, decepções e derrotas, porém nem todos nós somos capazes de vencer o que se nos apresenta a frente, Muitos seguem pelo caminho seguro, outros escalam os altos cumes e muitos se precipitam cachoeira abaixo e se prendem às tristezas abissais ou perdem-se em quaisquer dos calabouços mentais, como se vivessem em um mundo paralelo presas do álcool, drogas ou a decepção pelo insucesso e de si mesmos. Há Ícaros diversos que despencam de seus arrojados projetos e rastejam ate o final de suas vidas degredados da sociedade

Muitos de nós passamos ao largo dos seres desvalidos sem perturbação porque na vida sempre parece que somos cada um por si mesmo. Projetamos um sonho, porém não sabemos sobre as surpresas a frente, porque a vida é de aprendizado e o saldo do que fazemos a nós mesmos pode se traduzir em revezes impensados, em abandono, desequilíbrio e sermos presas de nossos próprios desvarios numa calçada da vida.

 Cada um dos seres que privatiza os espaços públicos tem sentimentos, riem, choram como qualquer um de nós, muitos seguem alheios e a deriva, mergulhando cada vez mais profundo no caos pessoal; outros sonham em emergir, outros tantos hão de conseguir. Há muitos seres que a maneira da fênix levantaram voo a despeito do mais adverso dos ambientes que tenham estado, a despeito de tudo e qualquer coisa em seu entorno. Nem todos, todavia acordam de volta a vida e sucumbem sob a hostilidade do desabrigo ,os desfavores do tempo e dos males da vida.

Quaisquer que sejam nossos nichos sociais, a camada social que vivenciamos, a altura do nosso voo, somos todos parte um do outro e formamos um só núcleo vivo e enquanto houver partes podres e esquecidas em nossa comunidade de seres jamais gozaremos do privilégio de vivenciar uma perfeita paz.

Por Edson Ovidio






quinta-feira, 27 de outubro de 2011

NOSSOS AMORES


"Nenhum bem sem um companheiro nos dá alegria."Fonte: - Cartas a LucílioTema: - Séneca

A cada dia sua surpresa!  Nem todos os dias são festivos, porém parece que sempre recolhemos lições, aprofundamo-nos em saberes e aprendemos do humano.
Hoje, veio-me a mim, via MSN, uma amiga; ela tinha um problema e queria compartilhar, queria opiniões, soluções para si, não sabia o que queria, queria paz. Seu marido a havia abandonado após desavenças e conflitos chegara ao fim um casamento de poucos meses. Pensei em mil maneiras de acalmá-la e devolve-la à sua paz perdida; pedi que ela procura-se por respostas em si mesma, deixasse a poeira baixar e então ela poderia governar-se melhor e acharia uma tratativa para o momento. Não obstante, ela continuou por horas a fio e cobrando de mim uma resposta, como se eu fosse a panaceia aos males do mundo. Ela discursava sobre a injustiça, sobre a traição, sobre o quanto ela fora fiel e ele infiel.
Fiz-me todo ouvido e invariavelmente lhe devolvia o problema. Após muitas idas e vindas ao mesmo ponto, chegamos a um denominador comum.  Ela ia tentar esquecê-lo por algum tempo ou definitivamente. Intempestivamente tive de sair, sob o risco de brigar com o mesmo tema “ad eternum”.
Nessa semana ainda estou sob a impressão de um contraponto ditoso, o casamento de um grande amigo. Meu amigo casou-se semana passada, um feito festivo não convencional, mas que sobejamente cumpriu o rito, mesmo porque envolvia duas pessoas queridas, de há muito conhecidas e plasmaram um fato bloco a bloco, após muitos vales e colinas e que o transcurso dos anos fez consumar-se.
Chegando a minha casa, ainda com os pensamentos fora de ordem, tentei fazer um arrazoado para que na minha forma tradicional, eu entendesse e tecesse comentários de mim para mim mesmo, despretensiosamente. Uma batalha mental entre a alegria ditosa do meu casal de amigos e a angustia da outra amiga
O fato é que todos indistintamente necessitamos numa escala que vai da compaixão até o amor, de alguém para compartilhar, para nos apoiar, para emprestar um ombro, palavras amigas, ternura ou carinho essencial.
Em nosso entorno orbitam as pessoas queridas com seus multiatributos e pele adentro habitam as pessoas com quem melhor sintonizamo-nos quer pela inteligência, afeto, nível de atenção e dentro do nosso coração habita a pessoa que prende os nossos olhos, aquela pela qual nos ligamos a seus cheiros, sabores, toques, mimos, ternura, virtudes ou quaisquer outros fatores, dos mais sutis aos mais grosseiros, dos mais vis aos mais nobres, do cerceamento do que somos a perfeita liberdade entre ambos.
A mitologia fala-nos de "Psique e Eros" e nas entrelinhas lemos sobre a racionalidade procurando a beleza das formas ponderando a quem amar e o amor se manifestando a despeito de tudo e quaisquer coisas, de maneira cega.
Será que a busca deve ser cega ou haverá de ter a intervenção do racional?
Num jogo a dois, conta muito as afinidades e o encaixe perfeito, a aceitação plena do que o outro pode ser e o que dele esperamos e vice-versa.  Fundamentalmente uma união pressupõe um único coração batendo em dois peitos diferentes, balizando o progresso e mantendo a chama da paixão acesa e gradualmente fazendo com que ambos orbitem a camada mais alta do que o que é o amor.
Eventualmente há os ajustes necessários entre nós é a pessoa a quem amamos e não devemos perder a oportunidade de entender o momento, também não devemos subestimar nossa percepção a cada passo ou deixar-se subjugar pelos encantos das formas ou vantagens outras que não tenham correspondência com aquilo que você é e pensa no presente momento.

Por Edson


sexta-feira, 21 de outubro de 2011

OURO DE TOLO (O VÍCIO)


"Procura a satisfação de veres morrer os teus vícios antes de ti.” 
Autor - Sêneca 
"Acabei por convencer-me de que a masturbação era o único grande hábito, a «necessidade primitiva», e que as outras necessidades, como as do álcool, da morfina, do tabaco, não passam de seus substitutos, produtos de substituição. “Fonte - Correspondência (1897) Autor - Sigmund. Freud


"Todos os vícios, quando estão na moda, passam por virtudes.

Autor - Molière, Jean


Essa semana, é uma daquelas muitas com bastantes impressões e por outro lado, eu não sabia sobre o que escrever, porém um ambiente onde estive essa semana foi o gatilho para um encadeamento de imagens e fatos distintos e sem uma aparente conexão lógica e formal entre eles, a não ser o que eu ousaria chamar de vício.

Parece não haver uma fronteira definida sobre o que é gozar com intensidade de uma fase da vida em que os modismos, os ritos de passagem e a sociedade  nos acercam com toda a sua volúpia, licenciosidade e compartamentos padrões de socialização e o ponto em que perdemos-nos  em excessos que progressivamente transformam o hábito em vício, ao ponto em que nos tornemos escravos de necessidades vicerais e nossa higidez fisica e mental  dissolvam-se inclementemente .


Constantemente queremos evidenciar a nós e aos que nos cercam que pertencemos ao universo de machos adultos da espécie ou que formamos  a nata daqueles que conseguem transformar o tédio das reuniões festivas em efervescentes noites movidas pelos vapores etílicos ou por qualquer outro componente da moda que eleve o tônus vibratório de tudo e qualquer coisa que esteja a nossa volta.  Projetamos em nosso inconsciente um mundo e vivenciamos um outro onde fabricamos  alegrias e discursos  que não nos pertencem verdadeiramente e talvez jamais nos lembremos de risos, gargalhadas ou opiniões que demos ou provocamos, fatos bons ou ruins em nosso entorno ou então jamais nos perdoemos pelo o que causamos a outros ou contra nos mesmos sob o efeito alucinógeno e hipnótico do álcool , tragando, inalando ou sorvendo venenos de prazeres pontuais e danos permanentes
Essa semana ultima, estive numa festa e meu foco de observação foi o álcool e seus aliados. Era uma festa de criança, porém a comemoração não se prendia especificamente ao mote da noite ou qualquer outro fato de monta, mas a turbulência festiva produzida pelos ébrios e pelo vozerio exaltado de quem perdera o controle das ações e julgava-se centro de todas as atenções, alguns poucos grupos comedidos conversavam animadamente.
A citação de Freud acima, a mim me parece uma assertiva e os jogos da mente parecem trocar o objeto do prazer individual para algo que se lhe assegure uma evidencia mais abrangente a um grupo maior, necessitamos o tempo todo satisfazer um desejo latente de pertencer ao grupo da moda.

Há aqueles que procuram os prazeres maiores ou evidencias mais latentes de que podem vivenciar algo mais além de si, além do calor da exaltação de um momento festivo familiar, que lhes dotem de superpoderes, como os que já ouvi de um ex-usuário relatando o fato de como sua consciência ganhava um efeito de multiatenção quando ele estava sob seus efeitos.

Há os que tentam voar cada vez mais alto para atingir prazeres que nunca atingiram antes e então são entregam gostosamente aos estertores da morte. E foi numa dessas noites que tive a oportunidade  de ver o quão dilacerantes são as quedas dos Ícaros que voam em direção ao sol.

__Eu andava pelas ruas do Centro velho de São Paulo, era uma noite chuvosa, porém a chuva dera uma trégua e havia ainda poças nas ruas.  A minha frente, depois de vários passos, vi uma cena Dantesca; alguns homens e mulheres participavam de um estranho garimpo de fragmentos em meio ao molhado, todos vasculhando freneticamente as poças rasas. Depois de alguns minutos observando o aspecto macabro compreendi que procuravam droga em meio a água como se lhes fora pequenas pepitas, pequenas preciosidades em para suas mentes.

Encerro este ensaio com um pensamento de Sêneca

““...  a natureza confiou-nos a tarefa de cuidar de nós próprios, mas, se formos demasiado complacentes, o que era tendência torna-se vício. Aos atos necessários juntou a natureza o prazer, não para que fizéssemos deste a nossa finalidade, mas apenas para nos tornar mais agradáveis àquelas coisas sem as quais é impossível a existência. Se o procuramos por si mesmo, caímos na libertinagem. Resistamos, portanto, às paixões quando elas se aproximam, já que, conforme disse, é mais fácil não as deixar entrar do que pô-las fora.
Séneca, in 'Cartas a Lucílio'
Por Edson Ovidio


quarta-feira, 12 de outubro de 2011

VIVA A CRIANÇA

Viva a Criança

"Nunca ninguém conseguirá ir ao fundo de um riso de criança.
" Victor Hugo”

"Sufoca-se o espírito da criança com conhecimentos inúteis.
"Voltaire

"As crianças não têm passado, nem futuro, e coisa que nunca nos acontece, gozam o presente.
"Jean de La Bruyère


Dia desses, tomei o troléibus para um trajeto curto entre diadema e São Bernardo, coloquei-me num espaço reservado a cadeirantes, contra o vidro que separava o piso mais alto com assentos e  o lado com piso rebaixado. Do lado elevado, junto ao mesmo vidro, uma criança brincava consigo mesmo , movimentando-se para lá e pra cá, rindo para o seu mundo e então olhou-me , esboçou um sorriso, passou o bracinho pelo vão do vidro, ofereceu-me  sua mão, cumprimentando-me à maneira que fazem os jovens e então fez um gesto de positivo mantendo o leve sorriso e incontinente retomou o seu mundo de faz de conta.
O gesto me devolveu a calma ao agitado dia, após ter dado duas aulas e por final a chuva que me encharcou os pés e tênis, a mim foi uma generosa paga pelo dia como voluntário
A mim o que mais me impressiona com esses fatos insólitos e por vezes imperceptíveis ao nosso mundo adulto é que  esses pequenos seres são capazes de grandes coisas, como se por magia  envolvessem-nos num momento de ternura e contentamento; olham-nos direto nos olhos e então repassam um gostoso sorriso, como se enxergassem bem além da nossa barreira cosmética.
O mundo adulto nos priva de sensações e de um universo de percepções e experimentações que um dia tivemos. As regras, tabus, máscaras de convívio somam fatos aos nossos anos, velando  mais e mais a forma lúdica como víamos e sentíamos o mundo e  que então com um preciso cinzel gravavamos em nossas memórias as melhores recordações de nossas vidas.
A vida é nada mais que uma escola em que as etapas do viver acrescentam um pouco do que havemos de ser pela nossa romagem terrena a cada dia, todavia dos primeiros fatos da nossa existência, deixamos que nosso sábio mundo infantil se perca na estreiteza da visão adulta, nas incertezas de todos os dias, na busca desesperadas por um futuro que esta sempre um passo além ou na insana mania de repetir em nós modelos rotos  e seduzimo-nos por grupos que repetem comportamentos, sentimentos e atitudes anacrônicos.  
Passamos assim da idade infantil a idade imbecil onde perdemos o foco das soluções fáceis de quando eramos crianças, quando tudo se resolvia com um sorriso ou que o trocar de mal era magicamente deixado para trás com uma pergunta gentil:

__Posso brincar também?

(Essa é uma singela homenagem a Criança que habita nos pequenos corpos e também dentro de cada um de nós)
 Por Edson


sexta-feira, 7 de outubro de 2011

AS SEMENTES DO ÓDIO


Sementes do ódio


"A ignorância é a mãe de todos os males."Autor François Rebelais

Nesta semana ouvi de uma mulher no metro, frases inusitadas. Ao telefone, falava ditosamente  a sua amiga do outro lado da linha sobre as vantagens do seu Deus e tecia comentários desairosos sobre o Deus de um amigo dela.

__ “... o Deus do amigo é segundo ele o arquiteto do universo e o... (sic)”.

Passo seguinte, a moça comentou sobre o seu Deus, o Verdadeiro, segundo ela. Ela falava com um desprezo tão grande contra esse outro tal Deus do amigo, e então pensei sobre o fato e a mim me soou risível, mas dai então me peguei divagando sobre algumas considerações sobre a tal conversa.

Recebi também a noticia, nesse mesmo dia, de que um amigo recebeu um sms de ameaça de alguém membro de uma escola de filosofia afamada, porque meu amigo divulgou ideias de sobre um assunto de domínio publico e que de alguma forma ofende essa escola.

Ambas as histórias estabelecem um paralelo surpreendente e a mim, as ações parecem partir de sementeiras diferentes, todavia submetidas as, mesma distorções a que são submetidas qualquer ideia que germine entre nós.

Cruzam e cruzaram pelo nosso planeta homens além do seu tempo, com ideais maiores que si mesmo, que alimentaram-nos com pensamentos arejados sobre uma variada gama de assuntos sobre os quais o humano é o pano de fundo. Com toda certeza polarizaram e fizeram orbitar em torno de si pessoas que beberam em profusão do que diziam, do que faziam e cada um procurou emular em si o que esses personagens foram para o seu tempo.

Todavia cada ser responde de forma diferente a todo e qualquer estímulo externo e cada ser age segundo a forma como lê, interpreta o mundo ou segundo a forma como abraça essa ou aquela ideia.

Ouvimos e admiramos os grandes homens e seus grandes feitos, ideias e palavras, porém à medida que trazemos ideias maiores ao nosso estreito e pequeno mundo, limitamos o entendimento a tudo isso e por consequência a resposta também se dará como um harmônico de menor brilho e intensidade e por vezes, divergente do ícone que tentamos nos associar.

Os luminares passam e passaram, porém deixam após sua passagem um arsenal de boas virtudes, que são então desposadas por outras pessoas, ganham peso, sabor, tempero, densidade e tintas diferentes do original. As ideias se travestem com roupagens novas e diversas e são então blindadas nos claustros da ignorância.

As correntes filosóficas que banham as nossas mentes, ganham por vezes aspectos ritualísticos e distorcidos de forma a atender a limitação do nosso entendimento ou a interesses de  grupos aos quais pertencemos , desviam-se, então, para o sectarismo hermético e cosmético,  abandonam o usufruto do luminar original e as palavras velam-se na ignorância, na cupidez, obtusidade e na insensatez dos dogmas e tabus sobre  ideias que transcendem o que pensamos.

Os dogmas, os tabus são os pais do ódio que inconscientemente germinam quando cismamos achar que o nosso próximo esta sob os auspícios de uma natureza menos digna ou que ele saúda a uma força geradora, diferente daquela que nós mesmos compreendemos.

Pense nisso!


Por Edson Ovidio